Ameríndios do Brasil: direitos ameaçados

21 de Noviembre de 2019

[Por: José Neivaldo de Souza]




O Programa das Nações Unidas (PNUD) criou uma forma, mais inteligente, para medir o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de um país. Mais inteligente porque, medir a riqueza de uma nação a partir dos dados puramente econômicos, é negar outros fatores fundamentais ao crescimento de uma sociedade como: saúde, educação e renda. A melhoria, nestes aspectos, já ajuda a perceber que o desenvolvimento de uma nação não se reduz à riqueza acumulada, mas compartilhada. Infelizmente a pior atuação do atual governo federal está nessas áreas, segundo os dados do “Datafolha”. Como estão os mais empobrecidos de nosso país? É imensa a fila dos vulneráveis, mas é importante refletir sobre o Índice de Desenvolvimento da população ameríndia como sujeito de direitos no Brasil. 

 

Saúde, para nós, herdeiros da cultura judaico-cristã, é a condição para ter uma vida longa. O principal argumento do governo para a Reforma da Previdência (PEC 6/19) contempla o fato da população está vivendo mais. Argumento questionável, mas não é caso rebatê-lo aqui. Os ameríndios não se apegam à vida e tampouco têm medo da morte, já que a consideram como “saída” do corpo e ocasião para o “encontro” com os ancestrais, os quais adoram. O “bem-viver” está na relação ecológica, na integração à mãe terra, a “Pacha mama”, como dizem os povos dos Andes. Diferente da civilização branca, a noção de “posse” está mais ligada à preservação, não à predação. O índice de saúde de um indígena é considerado a partir desta relação e da importância das florestas, rios, animais, plantas, minerais, etc. 

 

A política de exploração neoliberal, do atual governo, provoca uma reflexão: a devastação, para fins do agronegócio, hidrelétricas e minerações, ameaça os povos originários naquilo que eles mais necessitam para a sobrevivência. 

 

A educação, na perspectiva indígena, não se limita a ler e a escrever, é mais que isso: é transmissão da língua, das lendas, da arte e da religiosidade. Apesar da Constituição brasileira reconhecer os direitos culturais e as diferenças destes povos, a escolarização tem sido usada mais para “colonizar” do que para compartilhar saberes (LDB/1996). Que tipo de escolarização quer um governador que, em reunião com os governadores da Amazônia legal diz ao presidente da República que chegou a hora de explorar? Disse o governador: Disse Mauro Mendes: “Não queremos tirar terra de índio não. Nós queremos a riqueza que lá estão. Para tirar essa riqueza nós podemos afetar de 2% a 5% dessas áreas, não mais do que isso”.

 

Acrescentamos a isso a evangelização que, também segue o mesmo caminho: a maioria dos missionários cristãos se preocupam em converter as aldeias, apresentando uma moral condenatória de tudo o que diz respeito às suas crenças e tradições. Isso, como bem observou Pierre Bourdieu, é uma “violência simbólica”.  Que tipo de evangelização quer um missionário que, com a bíblia na mão, ensina a rezar a um “Deus” ansioso por dízimos? É bom lembrar que o poder se utiliza de todos os meios para dominar explorar. Se olharmos bem a história da evangelização, junto aos povos ameríndios, nos cabe pensar a frase atribuída a Desmond Tutu: “Eles chegaram. Eles tinham a bíblia, nós tínhamos a terra. Eles nos disseram fechem os olhos e rezem. Quando abrimos os olhos, eles tinham a terra e nós tínhamos a bíblia”. 

 

A renda. Neste fator é considerado o Produto Interno Bruto (PIB per capita) e o poder de compra. Que poder de compra tem o índio? Assim como o governador do Mato Grosso, muitos aderem à ideia de que debaixo das terras demarcadas há muita riqueza. Segundo o antropólogo José Otávio Catafesto de Souza, as demarcações garantidas pela Constituição cidadã são mais motivos de conflito do que de alegria. Depois de 30 anos, da sua elaboração, apenas uma “pequena parte das terras foi regularizada e mesmo as regularizadas estão colocadas em suspeição pelo Congresso e Executivo federais”. Vítimas do preconceito e da falta de reconhecimento, os indígenas mantem suas tradições e, às duras penas, sua língua.   

 

Para concluir é preciso retomar a pergunta: será que a média destes fatores, saúde, educação e renda, igualmente importantes para o desenvolvimento humano, serve para a população ameríndia?  O que vemos é o desprezo e a falta de cuidado por parte do Poder vigente para preservar as comunidades e etnias. Submetidas ao controle do Estado, são levadas a aceitarem as leis, seja pela escolarização, pela evangelização, pela grilagem de terra ou pelo Aparelho Repressor do Estado (expressão do sociólogo Louis Althusser). Como mudar esta situação? O primeiro passo é a solidariedade aos nossos irmãos ameríndios; o segundo é: não reproduzir os interesses de um Poder cuja ideologia se sustenta à base do lucro e do acúmulo de capital; e o terceiro: apoiar as políticas públicas que buscam resgatar a cultura dos povos originários. 

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